Nelson Vasconcelos
para O GLOBO
À PRIMEIRA VISTA É QUASE um paraíso. Imagine que o comandante Dardo Basadra, astronauta do século XX, sofre um acidente numa aterrissagem desastrada, passa uns 13 mil anos dormindo e, quando acorda, a Terra está habitada por dois bilhões de mulheres e ele, somente ele, a representar o sexo masculino. Os outros machos — que quase destruíram o planeta — sumiram do mapa há 12 séculos. Mas, por pura incompetência da engenharia genética, as sucessivas clonagens de mulheres estão, por assim dizer, produzindo espécimes de qualidade inferior. E cabe a Basadra, portanto, fornecer sêmen para a perpetuação da humanidade.
Entretanto, com Basadra preso e disputado por grupos inimigos de mulheres histéricas, a história muda. Ou recomeça. Daí em diante, bem, há que se ler “Éden 4”. Não dói. Como nos outros livros de Alexandre Raposo, a narrativa desce como um bom chope, e chegar ao fim da dose é inevitável. Várias doses, neste caso, pois agora Raposo apresenta uma coletânea de 15 contos fantásticos. Sempre — e ainda bem — com humor.
Como em seus dois romances anteriores, Raposo mostra que conhece a manha de contar uma história, curta ou não. Se os romances ganhavam corpo à medida que o enredo se impunha, os contos ganham o leitor logo de imediato. Não seria essa uma das características do bom conto?
Mais que isso, Raposo se sente bem à vontade na hora de criar situações (aparentemente) absurdas ou (por enquanto) impossíveis e apresentá-las sem preocupação com propostas estéticas ou teóricas intrincadas, camuflando sub-textos e outras coisas do gênero, que em geral interessam a muito poucos leitores qualificados. É nítido que Raposo escreve seus textos para se entreter com as palavras, e quer que seus leitores façam o mesmo. Consegue, sem dúvida.
Os contos curtos dão bons exemplos de como Raposo mantém um pé no cotidiano e outro sabe-se-lá-onde. Em “De olhos bem abertos”, por exemplo, o mote é a ligação misteriosa entre um seqüestrado na Baixada Fluminense e um menino doente das idéias, que ajuda a libertar a vítima. Intrigante, assim como “Justiça”, desaconselhável para estômagos mais fracos. E “Ambulante” dá uma versão bem plausível do futuro daqueles sujeitos simpáticos que entram em ônibus para vender balas.
Talvez distraidamente, alguns contos escondem alguma poesia, alguma melancolia, quando abordam a solidão, a morte, a saudade. Mas sem frescura. Em “Ano-bom”, um busca-pé tagarela invade o apartamento de uma senhora viúva para salvá-la da morte. Na verdade, é seu marido, morto há alguns anos, que vai levá-la de vez para outro mundo. “Succubus”, “A onda” e “O Peixe-Rei” também merecem a atenção do leitor, sem favor algum.
Adorei!!! Simplesmente do balacubaco... asta!
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